sábado, 4 de julho de 2009

Ponto de vista ou de faro

Cada dia somos mais solicitados por outros, como se não bastassem nossas demandas pessoais. Amigos, namorados, filhos, pais, cônjuges. Professores, chefes, colegas. Por isso, nem sempre damos conta de fazer tudo que nos pedem. Às vezes precisamos “desobedecer” um pouco.

Eu, por exemplo, devia estar fazendo muitas outras coisas nesse momento. Não vou listar todas. Sentar aqui na frente do computador para escrever esse texto foi, até certo ponto, uma escolha pessoal (claro que assumi um compromisso, mas poderia fazer isso em outro momento). Apesar disso, há algo que deveria estar fazendo, mas não estou, por uma limitação pessoal, não por escolha própria.

As instruções que recebi foram: escrever sobre um cheiro de comida que remeta a alguma lembrança. Não dá. Claro que conheço vários cheiros deliciosos. Claro que tenho várias memórias. Mas não consigo fazer nenhuma relação entre as duas coisas. Quando fiz tal constatação, pensei: se quer ser escritora, precisa ser criativa. Portanto, invente. Também não deu. Resolvi desobedecer, se não o texto não sai. Vou mudar um pouco o tema.

Tem um cheiro que de vez em quando eu sinto e que me reconta várias histórias. Não é um cheiro muito especial em si. É até bastante comum, principalmente para pessoas que moram ali por perto. Mas é o que eu tenho.

Sabe a Cidade Universitária, ali na Ilha do Fundão? É um lugar banhado pela Baía de Guanabara, cheio de manguezais, com uma fauna riquíssima. Ou deveria ser. Não sei ao certo. O que sei é que aquela região tem um perfume um tanto particular e inevitável a todos que passam por ali, sejam quais forem seus destinos.

Doce ilusão é fechar os vidros e ligar o ar condicionado do carro – para aqueles que dirigem. O cheiro entra por frestas microscópicas e se instala dentro do carro. Pobres coitados são os que nem ao menos podem usufruir desta utopia odorífera proporcionada pelos vidros fechados. Viajam de ônibus e precisam optar entre o tão conhecido odor e o igualmente agradável calor.

Apesar das inconveniências dessas partículas malcheirosas que vagam pelo ar e adentram nossos sistemas olfativos, confesso ter certo prazer com o cheiro. Não que seja capaz de saboreá-lo, mas me traz muitas lembranças, algumas bastante agradáveis.

Minha avó paterna teve três filhos: meu pai e minhas duas tias. Antes mesmo de eu sonhar em nascer, a mais velha das mulheres se mudou para bem longe. Algo como 10.306 quilômetros. Quase nada. Junto foram o marido e os três filhos, ainda bem pequenos.

O resto da família ficou aqui, a ver navios (se fôssemos de São Paulo talvez tivéssemos ficado a ver aviões, como todo bom paulistano adora fazer). Mas, pra ser sincera, nem tanto assim. Não lembro a frequência das visitas que nos faziam, principalmente meus tios, quando eu era mais nova. Até porque meus avós às vezes revezavam com eles e iam desembarcar lá do outro lado do planeta. Sei apenas que aconteciam vez ou outra.

Em geral era meu pai quem buscava os tios no aeroporto. E lá ia eu junto com ele. Acordava mais cedo, parava o que estivesse fazendo ou cancelava um de meus compromissos de criança. Só para entrar no carro, ir até o aeroporto, ficar esperando algum tempo e depois voltar para casa. Só?! E o prazer dessas visitas?

Adorava rever os tios distantes. Ficava toda orgulhosa porque tinha família lá longe, num país que, na época, nem sabia dizer aonde era. Adorava ganhar chocolates, biscoitinhos de sopa (eu comia – e como – tal qual um pacote de salgadinho qualquer), pantufa, casaco. Qualquer coisa trazida pelos parentes queridos vindos de tão longe era bem vinda.

Além disso, havia também os jantares de família. Minha avó já começava a não ter forças para celebrar todos os feriados. Mas quando os tios estavam aí, não havia nem o que discutir: qualquer oportunidade que aparecesse era celebrada com um farto jantar, repleto dos pratos preferidos de cada um.

Ah, como eu adorava tudo isso!

Impossível reclamar do cheiro do mangue. O cheiro do caminho do aeroporto, que também cheirava a abraços, beijos, presentes, comidas, festa. Bem ou mal, cheirava a família.

Isabel Camargo Dain

sexta-feira, 3 de julho de 2009

Loteria da Vida

Foi notícia esta semana a queda de um avião bimotor em Trancoso, Bahia, no qual viajavam três gerações da família do empresário Roger Wright. Sendo o ocorrido já o suficientemente doloroso, essa tragédia chocou-me ainda mais ao saber que a fatalidade voltou a atingir essa família, uma vez que sua primeira esposa já havia perdido a vida em outro acidente aéreo, o trágico vôo 402 da TAM, em 1996.

Em momentos como esse, fantasio explicações para aplacar a tristeza que me abate e permitir ver algum sentido neste jogo da vida. Imagino haver nas mais longínquas alturas, bem próximo ao habitat dos serafins, uma Caixa Econômica Celeste, a CEC, onde se organizariam diferentes modalidades de sorteios diários. Um, em particular, se adapta à minha divagação : o da Mega Sina, responsavel por premiar os agraciados com a sina escolhida. Assim, nós humanos, ao nascermos, seríamos registrados num livro, digamos o livro da morte, e ganharíamos um número de inscrição. Àqueles desejosos em antecipar a volta ao reino dos céus, colocariam seus números de registro em uma grande urna localizada na matriz da CEC, indicando, ao mesmo tempo, numa ficha própria, a forma e o dia desejados para o retorno. Caberia à administração da CEC reunir em um grande banco de dados estas incrições, promover os sorteios e classificar os inscritos em grupos distintos. Consigo, assim, explicar, a razão para tantas mortes simultâneas recentes, tais como o do tufão Karina, o terremoto da Itália e tantas outras tragédias. Todos os que pereceram, o foram estritamente de acordo com suas escolhas, premiados pela Mega Sina. Sorteio, como o que originou o desaparecimento de 200.000 pessoas, no caso do tzunami na Indonésia, certamente ocorreu em semana com prêmio acumulado.

A partir destas divagações e em prol da minha estabilidade emocional passarei, a partir de agora, a encarar a vida não mais cheia de fatalidades. Aceitarei que hajam filas imensas à porta da fictícia CEC, exercendo cada individuo o seu direito de escolha. Procurarei eliminar o sentimento egoista que causava em mim muita tristeza, ao me permitir aceitar a escolha de cada um. Não mais sofrerei por doenças, sejam terminais ou não. Hospitais, nesta minha nova fase, serão meros spas. Guerras, brincadeiras de mocinho e bandido.

Sinto-me mais leve, após esta engendrada viagem pelo imponderável. Um dia, certamente, encontrarei os Wright no reino dos céus, a quem devo este maravilhoso “insight”. Espero, no entanto, que este encontro ainda demore algum tempo.

Confesso que devido ao meu gosto exacerbado pela vida fiz questão de perder o meu número de inscrição. Detesto jogos de azar.

Isaias Goldsmid

sexta-feira, 26 de junho de 2009

Por água abaixo

Já são quase oito da noite e ainda não terminei a maquiagem! Tem que ser no capricho hoje. Contorno forte na boca, batom vermelhão, ah, e um olhar de mormaço, com muito delineador e rimel, para homem nenhum botar defeito. Vou estrear os cílios que ele me deu ontem. Vão fazer a diferença...

Afinal essa noite promete! Minhas sandálias prateadas com saltos dez, à Carmem Miranda, as meias arrastão. Uau, ótimo! Agora, um pouco de gel, e o topete fica seguro, no ponto certo. Mas minhas madeixas, vou deixar caírem como um véu negro, lisas, compridas, até a altura das axilas.

Que vestido vou escolher? – O vermelho, com brilho e frufru, ou aquele de oncinha, que tem o decote sensual até o busto? Ah, acho que este vai ficar perfeito! É curtinho, e a pelúcia disfarça minha magreza.

Agora um toque de perfume. O doce é o mais gostoso! Entre os seios, atrás das orelhas e nos pulsos. Hum, o cheiro vai enfeitiçar o gringo! Tenho certeza.

Espelho, espelho meu, há nesse mundo mulher mais charmosa do que eu? Bem, já dá pra apagar a luz do banheiro. Ah, não posso esquecer a minha bolsinha de lamê. Tá lá na mesa.

Nunca fiquei tão excitada! Pudera, com tanta promessa que o gringo fez ontem, quero mais é acreditar!

E esse elevador que não chega! Que saco! Ei! Solta a porta aí! Até que enfim! Agora é só essa geringonça chegar ao térreo. Treco velho, parece uma carroça! Não anda!

Meu Deus! Que temporal Este não tava no programa! Oh Seu Francisco! Essa água já ta aqui na portaria. O senhor não vai tomar uma providência? Isso aqui é edifício ou é barco?

Como é que eu não vi nem ouvi nada? Nem os raios, nem os trovões? Que estardalhaço dessa natureza! Tão tramando contra mim! Assim não pode ser. Meu encontro foi por água abaixo. Tem galho de árvore, lixo, rato. Tem de tudo! Carro parado, afogado, motorista abandonando o carro. Eu hein? Só pode ser pra buscar socorro. Ih, tem até correnteza! Cadê a rua? E a calçada? Sumiu tudo! Oh Seu Francisco! Oh Seu Francisco! Acode aqui!

E agora?

Lêda Maria

quinta-feira, 25 de junho de 2009

Sorriso, desta vez eu vou ganhar...

Tardinha de sábado. Dia tranquilo, sol de outono, temperatura agradável.
Eu vinha com minha filha da praia, tínhamos tomado um suco, e minha filha ainda carregava o saquinho com pães de queijo.
Logo ao entrar, notei que ela não era lá muito simpática.
Sorri como de costume.
Tinha um ar blasé. Perguntou-me se eram duas passagens. Respondi que sim, ainda com um sorriso. Ela apertou automaticamente o botão e a maquininha escreveu: passe... Deu o troco, e eu e minha filha nos sentamos.
Desta vez não fui olhando o mar.
Reparei na trocadora, uma senhora.
A conversa me chamou a atenção.
Falava bem alto, como se não houvesse mais ninguém no ônibus.
- Ôoo Reinaldo, você sabia que na casa do Guilerme eles gastam um butijão de gás por mês? Não consigo entender como eles conseguem. Deve ter alguma coisa errada. Na casa do Guilerme é só ele mais a Soraya e a Tininha. Ele e a Soraya trabalham o dia todo e a Tininha quando chega da escola...
Um senhor, bem apessoado, interrompe para dar um “bom tarde de sábado de outono”; ela pega o cartão, de gratuidade da terceira idade, passa na maquininha e diz: - Pode passar. Passam mais três passageiros.
Uma mãe, com um recém-nascido no colo, vem pagar a passagem pela contramão. Ela olha para o bebê sem expressão, inclina-se de lado e roda a roleta.
Continua a conversa ainda intrigada com o botijão de gás do Guilerme:
- Lá em casa volta e meia eu faço bolo, até pudim e o meu botijão dura quase três meses.
Reinaldo, o motorista, sugere que talvez eles aqueçam a água do banho no fogão.
Os dois riem divertidos.
Reinaldo grita:- Entra por trás, por trás.
O rapaz entra e senta naquele banquinho onde se pode ler: “Fale ao motorista somente o indispensável”. E o “indispensável” como se ouve a seguir, é um falatório sem fim.
Ela se vê sozinha, não tem mais com quem jogar conversa fora.
O ônibus para no ponto onde está o fiscal e ela grita animada.
- Ôooo Sorriso, desta vez eu vou ganhar!
Grita abanando o papelzinho da loteria acumulada.
O rosto de Sorriso se ilumina.
A viagem recomeça.
Ela pega o telefone celular e tenta ligar. Entra um passageiro, ela desliga o celular e o põe no bolso, como se colocasse o maço de cigarros.
O passageiro passa.
O celular toca, ela combina e diz até lá.
Incomodada com o banco desconfortável, se ajeita.
Começa a contar...
Entra outro passageiro.
Sorriso automático ao “boa tarde de outono”.
O passageiro passa.
Recomeça a contar o dinheiro.
Abre a gaveta, guarda o dinheiro contado, tira uma bandejinha de isopor com uns pãezinhos, morde um...
Passageiro entra...
Guarda a bandejinha de isopor e...
Lambe escandalosamente os dedos, um a um. Lambe com prazer. Pai de todos, fura bolo, mata piolho...
Passageiro passa, sem resposta ao cumprimento.
Recomeça a comilança.
-Reinaldo, o pãozinho é ótimo!
Entre passageiros e lambidas, ela passa o resto do sábado de outono.
Seu mundo é Reinaldo, e claro, o lanchinho também.
Os passageiros passam.
Eu salto.
No dia seguinte confiro no jornal: Nenhum apostador acertou as seis dezenas.
Sábado que vem ela vai gritar com fé:
- Sorriso, desta vez eu vou ganhar!

Márcia Lopes

Sexta-feira treze ou a perua na tempestade

Sexta feira treze! Como não pensei nisso antes?
Acordei e tomei o café da manhã com toda a calma.
Depois olhei pela janela do apê para ver como estava o tempo: chovia muito. Precisava escolher uma roupa bem transada para causar boa impressão. Afinal não é sempre que pinta uma oportunidade dessas: fui chamada para uma seleção de modelos fotográficos numa agência chiquérrima!
Fiz a maquiagem, carregando um pouco mais no sombreado dos olhos e no rímel. Escolhi a blusa verde limão, de babados fartos sobre o decote. Evidenciava os seios que eu turbinei com silicone, e que ficaram divinos! Vesti a calça Versace que tinha uns bordados em metal nas costuras laterais: um luxo! Escolhi os brincos dourados, novinhos em folha (as pulseiras,várias, foram colocadas uma a uma, numa ordem específica). Calcei as botas de salto-agulha que fazem as pernas parecerem mais torneadas.
Desci dez andares de escadas porque tinha faltado a luz.
Na rua, o vento era de virar guarda chuva do avesso.
Tentei pegar um táxi: parecem evaporar quando chove! Os bueiros das ruas, sempre entupidos, não davam vazão à água que caía.Mas o nível da água começou a subir demais: não era possível que viesse só da chuva. Vinha da praia, e vinha com força. Fui até à rua transversal e consegui ver o mar.
Paralisada, vi que as ondas eram gigantescas. Nem a pior ressaca que eu já tivesse visto poderia se comparar àquilo.
As pessoas começaram a correr. Eu tentava manter a classe, mas o nível da água, subindo, já formava uma correnteza capaz de me jogar no chão, e me segurei num poste.
Minhas lindas botas estavam inundadas. O salto agulha ficava preso nos buracos das calçadas de pedra portuguesa, me fazendo cair algumas vezes. Meu cabelo foi se desmanchando, os babados da blusa perdiam volume, eu estava encharcada e com muito medo! A minha bolsa caríssima foi-se embora na correnteza.
Já não se via onde terminava a calçada e começava a rua: era um mar de águas cobrindo tudo, e os carros eram arrastados pela correnteza.
Entrei num prédio onde o porteiro já tinha dado no pé: a portaria estava alagada, a água ia até a minha cintura. Não adiantou: a porta interna que dava para as escadas estava trancada. Saí depressa, com medo de morrer afogada, o nível da água continuava subindo.
Comecei a nadar. Tinha gente em cima das árvores, gente gritando, cachorro nadando.
Passei perto de um galho e o agarrei com muita força. Consegui me sentar nele, como um macaco.
A correnteza ficava cada vez mais forte.
Em outros galhos da mesma árvore estavam dois homens e uma mulher, em perigo, como eu, sentindo o cheiro da morte.
Durou muito tempo essa tortura, até que água foi baixando e eu desci da árvore, devagar, me perguntando onde estava o meu mundo perfumado de cosméticos e roupas.
Desviando dos destroços, andei pelas ruas em ziguezague.
De esgueira, e espiando, a cara dura da realidade.
Angela Nabuco

A HORA E A VEZ DE A. M.

Não é a primeira vez que participo de um grupo em que se propõe que se liste os 10 melhores filmes, na opinião de cada um. Não é tampouco a primeira vez que omito na minha lista um filme que teve um papel fundamental na minha vida: “A hora e a vez de Augusto Matraga”. A omissão não é gratuita. Não se trata de desmerecer a beleza ou a importância do filme. A questão é que eu simplesmente não o assisti.
Estava eu fazendo dois meses de cursinho pré-vestibular (depois de muitos cálculos foi o que deu para pagar), e um colega começou a me paquerar: me dava carona após a aula, convidava para um chopinho e coisa e tal. Eu nunca tinha namorado, mas os hormônios adormecidos pelo intelecto se impuseram, e um dia acabei aceitando acompanhá-lo até o pequeno apartamento que improvisara, depois de um desentendimento com os pais, em Santa Teresa.
Era um rapaz razoavelmente rico, na minha avaliação, pois carro e apartamento eram sinais de uma vida bem diferente da minha. Nasci pobre, e minha mãe tinha uma série de preceitos que tínhamos de seguir por isso: tínhamos que ser honestos (“pobre vai para a cadeia, rico não”); trabalhar muito sem descuidar do estudo (“ter uma profissão, um emprego com estabilidade”); aliás, tirar sempre as notas mais altas (“rico não precisa, tem herança”); não ver tevê na casa dos outros (para não saberem que não tínhamos); não ler jornal (“tem muita coisa imprópria”) nem gibi, só livros; andar sempre arrumado (ela mesma varava a noite costurando, cerzindo, lavando e engomando as nossas roupas); falar direito (nem gíria, nem palavrão, nem apelido).
Havia ainda os preceitos específicos por sexo: meus irmãos não podiam nos bater, o que era ótimo: quando eu brigava com um, ele não podia revidar (“homem não bate em mulher, nem com uma rosa”); já as filhas mulheres (minha irmã e eu) não podiam ser “moças fáceis”, nem ficar pensando em namoro e casamento, pois “mulher não pode depender de homem, tem que ter uma carreira”. Assim, eu via minhas coleguinhas de ginásio trocando confidências e segredinhos, rindo maliciosamente, enquanto eu vivia mergulhada nos livros.
Eu tinha decidido enfim por uma profissão: ia estudar Sociologia. O motivo era tentar entender essa dicotomia entre ricos e pobres que matizava toda a minha vida, e que eu sabia que não era culpa nossa (afinal, fazíamos tudo certinho), nem de Deus (a essa altura não mais que uma sublime ausência). Achei que só podia ser uma questão social, e me dispus a decifrá-la.
Então ali estava eu , de repente, no apartamento do colega, que foi logo se pondo à vontade, tirando sapato, camisa, sentando no colchão que fazia as vezes de sofá e cama, cheio de almofadas, no chão. Ficamos conversando, ouvindo música, descobrindo muita coisa em comum, e eu também fui ficando à vontade. Logo estávamos nus, trocando mil carícias. Tudo muito natural e gostoso, eu enfim me tornando mulher.
Sabia que tinha cometido um pecado mortal, pelo menos para minha mãe; ele me deixou em casa (na esquina, pois também não se devia deixar ver que morávamos num prédio de conjugados), mas eu tinha perdido totalmente noção da hora. Minha mãe me esperava na portaria, e, ao me ver, mudou o ar de preocupação para reprovação. Perguntou onde eu estivera, respondi rapidamente, pedindo desculpas, que tinha ido ao cinema com algumas colegas. - Que filme? - ela perguntou, brava.
-“ A hora e a vez de Augusto Matraga” - foi o que me ocorreu; tinha ouvido alguém comentar sobre esse filme, e tinha certeza que mamãe não saberia o que era – não me lembro de tê-la visto ir ao cinema, mas mesmo que fosse, não seria para ver filmes nacionais, pois, segundo ela, “ antes era só pornografia, agora só mostram miséria” . Ela certamente assinaria em baixo a declaração, depois famosa, do Joãozinho Trinta, de que “pobre não gosta de miséria; quem gosta de miséria é intelectual”.
Já me deparei, depois, com anúncios desse filme em algumas mostras de cinema brasileiro, mas nunca quis assistir. Desconheço o diretor, os atores, o enredo. Minha impressão é que, se o vir, estrago o prazer da minha maior mentira. No meu imaginário, também recuperaria a virgindade, da qual custei tanto para me livrar.
Angela Tygel

Invisível: Um retrato anônimo

Em dias como este o movimento fica fraco por aqui. O dia mal clareou e o despertador acordou-me, lembrando de tudo que viria pela frente - a mesma rotina; velhos hábitos que nunca mudam, e logo vi que iria chover. Só não imaginei que choveria tanto, e, sem dar-me o luxo de ficar na cama, saí para o trabalho mesmo assim. Vivo em uma verdadeira selva: matar para não ser morto.
Trabalho praticamente vinte quatro horas. Ganho o suficiente, exceto em dias como esse. Chuva magnânima: cega, asssusta, maltrata. Braço direito da solidão, isso sim.
Meus clientes mais abastados e generosos desviam a atenção de nós - que somos mais invisíveis que cachorros pulguentos e molhados - e precisam atender os feridos, suicidas e boêmios, que aproveitam para usar a chuva como cenário da destruição. Esconder o feio com o bonito, a velha regra que faz o mundo girar.
Sou sempre a segunda opção: boneca sem sentimentos, queridinha do papai, aluna obediente. Devo seguir o roteiro e tenho infinitas possibilidades, exceto ser eu mesma. A chuva quer apagar o meu eu. Espero que consiga.
Escolhi o trabalho errado. Comecei achando que ser prostituta me faria ser gostada, amparada, visível. Como pude ser tão ingênua?
Hoje, especialmente, ando pelas ruas vazias, procurando qualquer ser vivo que me queira. Meu batom vermelho está borrado e grossas lágrimas de rímel escorrem pelo meu rosto. Não sei se são lágrimas, ou simplesmente chuva. Ao contrário desta tempestade, estou seca por dentro.
Ouço raios e trovões, mas é preciso ser indiferente, e continuar procurando. Preciso ser necessária em uma cama quentinha, preciso ser vista. O barulho não me assusta. Sendo bem sincera, a chuva que me molha mostra-me que ainda estou viva.
Queria deixar que a tempestade me levasse. Por mais que eu a deixe entrar em mim - o que é feito gentilmente, ao contrário de muitos machões com que saio - não consigo sentir-me limpa. Queria recuperar a inocência.
Meus pés não me obedecem mais. A chuva varreu minhas esperanças. Traiçoeira, limpou meu sustento e deixou o cheiro do pecado grudado em minha pele. A culpa transcorre em minhas veias, mas me é cômodo senti-la; é a única coisa que conheço.
Ensopada dos pés à cabeça, rezando para que um raio me atinja, ando à toa. Vultos me perseguem, demônios correm atrás de mim. Fogos-fátuos confundem minha sanidade. Grito; meus ecos escondem-se de mim. Estou sozinha.
Decido-me por voltar para casa e fazer o que faço melhor: ser invisível. Com chuva ou sem chuva.
Manuela (in memorian)

segunda-feira, 22 de junho de 2009


Crônica de Rogério Menezes
publicada na coluna "O LOBO NO AR"


O ovo cada vez mais apunhalado


A pergunta era feita por minha mãe, à beira do fogão a lenha, aos quatro filhos que se sentavam para tomar o café de todas as manhãs em meados dos anos 1960, nos baixos grotões do interior da Bahia: - Querem hoje o ovo com a gema dura ou mole?

Meu irmão e minhas duas irmãs variavam as respostas – e nunca soube porque ontem desejariam gemas moles e hoje, gemas duras (e vice-versa). Eu, no entanto, invariavelmente, chovesse ou fizesse sol, sabia o que queria, e dizia, cheio de convicção:

- Mole, minha mãe, mole.

Mole, e nem precisava dizer, minha mãe sabia desse meu capricho (e o respeitava), a gema não podia ser quebrada, sequer rachada. Tinha de chegar à mesa, intocada, imaculada, cheia como lua cheia e naquele inolvidável tom forte de amarelo que a marcava. Cercava-a rija clara branca, sempre riscada-chamuscada em vários pontos por veias douradas provocadas pela fritura na manteiga quente.

Essa cobiçada gema-lua-cheia-amarelo-forte só poderia ser desmanchada por mim e a desmanchava com prazer: nela mergulhava chumaço de miolo de pão, que, devidamente empapado com aquela gosma sublime, era em seguida depositado na minha boca que, àquela altura do café da manhã, já salivava caudalosamente, amazonicamente.

Esse ovo-frito-por-minha-mãe foi certamente o meu mais remoto objeto de desejo gastronômico e, como já dizia o sapientíssimo Sigmund Freud, o primeiro objeto de desejo gastronômico (ou não) a gente nunca esquece. Mais: a gente nunca parará de desejá-lo.

Batata. Não deu outra. O mundo girou. A ema gemeu. A minha mãe morreu. A Bahia virou remota batucada. Tornei-me vetusto senhor que parece nunca querer se fixar em porto (seguro ou não) algum, seja cidade, pessoa ou idéia. Mas a paixão pelo ovo-com-gema-mole-frito-na-manteiga permanece incólume e, se depender de mim, perdurará até o fim dos (meus) tempos.

Claro, os ovos fritos que eventualmente devoro hoje em dia não têm esse capricho
materno – longe disso. Na correria desses tempos velozes, às vezes obrigo-me a ignorar a gema que se partiu assim que tocou o fundo negro da frigideira antiaderente. Ato contínuo: acabo perdendo a paciência e, heresia das heresias, misturo gema e clara em colheradas vigorosas e engulo aquela praga-do-café-da-manhã-de-todos-os-hotéis: os indefectíveis ovos mexidos.

Verdade que profetas diversos e perversos pipocam de todas as direções, todos ávidos em disparar vaticínios funestos. Todos absolutamente determinados a interromper esse affair gastronômico-amoroso entre mim e o ovo-com-gema-mole-frito-na-manteiga. Uns advertem: ‘Cuidado, a gema (justo a amada e idolatrada gema?) aumenta o colesterol e entope as artérias e provoca infartos fulminantes.’ Outros acusam: ‘Suas calças não vão lhe caber mais se continuar comendo ovos fritos!’
Diante dessa algaravia macabra de alertas alarmistas finjo-me de morto. Homem experiente que sou, não posso, nem devo, ouvir esses tocadores de trombetas do apocalipse que assopram tragédias – embora esses tocadores de trombetas do apocalipse se reproduzam e se espalhem com a velocidade dos raios e dos tsunâmis. (Adoram listar alimentos, situações e beberagens variadas que, juram, nos garantirão o paraíso. Adoram também listar, alimentos, situações e beberagens que, juram, nos farão sucumbir no fogo do inferno no próximo segundo).

Os itens dessas listas podem, a depender da força das marés e, principalmente, dos vorazes marqueteiros de milionários e gulosos grupos alimentícios internacionais, se intercambiar num piscar d’olhos. O ovo, por exemplo, foi redimido em rede nacional de tevê há alguns meses. O ovo, por exemplo, foi execrado (principalmente a minha adorável gema mole, agora acusada de hospedar salmonelas homicidas) em rede nacional de tevê na semana passada.

O ser humano adora brincar de controlar o incontrolável. Não será exatamente gema mole a mais ou a menos que adiará o inadiável. O que tiver de ser será, com ou sem o adorável ovo-com-gema-mole-frito-na-manteiga.

Carpe diem – antes que o fogo se apague, e, sabemos, todo o fogo se apagará algum dia.

Rio de Janeiro - 21/06/2009

quarta-feira, 17 de junho de 2009

Um certo visionarismo


As crônicas esportivas também fazem muito sucesso.
A primeira crônica de Nelson Rodrigues sobre Pelé.
Reparem na data e nas palavras do Nelson.
Santos 5x3 América, 25/02/1958
no Maracanã (estádio Mario Filho!!!).

Depois do jogo América x Santos, seria uma crime não fazer de Pelé o meu personagem da semana. Grande figura, que o meu confrade Albert Laurence chama de “o Domingos da Guia do ataque”. Examino a ficha de Pelé e tomo um susto: — dezessete anos! Há certas idades que são aberrantes, inverossímeis. Uma delas é a de Pelé. Eu, com mais de quarenta, custo a crer que alguém possa ter dezessete anos, jamais. Pois bem: — verdadeiro garoto, o meu personagem anda em campo com uma dessas autoridades irresistíveis e fatais. Dir-se-ia um rei, não sei se Lear, se imperador Jones, se etíope. Racionalmente perfeito, do seu peito parecem pender mantos invisíveis. Em suma: — Ponham-no em qualquer rancho e sua majestade dinástica há de ofuscar toda a corte em derredor.
O que nós chamamos de realeza é, acima de todo, um estado de alma. E Pelé leva sobre os demais jogadores uma vantagem considerável: — a de se sentir rei, da cabeça aos pés. Quando ele apanha a bola e dribla um adversário, é como quem enxota, quem escorraça um plebeu ignaro e piolhento. E o meu personagem tem uma tal sensação de superioridade que não faz cerimônias. Já lhe perguntaram: — “Quem é o maior meia do mundo?”. Ele respondeu, com a ênfase das certeza eternas: — “Eu”. Insistiram: — “Qual é o maior ponta do mundo?”. E Pelé: — “Eu”. Em outro qualquer, esse desplante faria rir ou sorrir. Mas o fabuloso craque põe no que diz uma tal carga de convicção, que ninguém reage e todos passam a admitir que ele seja, realmente, o maior de todas as posições. Nas pontas, nas meias e no centro, há de ser o mesmo, isto é, o incomparável Pelé.
Vejam o que ele fez, outro dia, no já referido América x Santos. Enfiou, e quase sempre pelo esforço pessoal, quatro gols em Pompéia. Sozinho, liquidou a partida, liquidou o América, monopolizou o placar. Ao meu lado, um americano doente estrebuchava: — “Vá jogar bem assim no diabo que o carregue!”. De certa feita, foi até desmoralizante. Ainda no primeiro tempo, ele recebe o couro no meio do campo. Outro qualquer teria despachado. Pelé, não. Olha para frente e o caminho até o gol está entupido de adversários. Mas o homem resolve fazer tudo sozinho. Dribla o primeiro e o segundo. Vem-lhe ao encalço, ferozmente, o terceiro, que Pelé corta sensacionalmente. Numa palavra: — sem passar a ninguém e sem ajuda de ninguém, ele promoveu a destruição minuciosa e sádica da defesa rubra. Até que chegou um momento em que não havia mais ninguém para driblar. Não existia uma defesa. Ou por outra: — a defesa estava indefesa. E, então, livre na área inimiga, Pelé achou que era demais driblar Pompéia e encaçapou de maneira genial e inapelável.
Ora, para fazer um gol assim não basta apenas o simples e puro futebol. É preciso algo mais, ou seja, essa plenitude de confiança, certeza, de otimismo, que faz de Pelé o craque imbatível. Quero crer que a sua maior virtude é, justamente, a imodéstia absoluta. Põe-se por cima de tudo e de todos. E acaba intimidando a própria bola, que vem aos seus pés com uma lambida docilidade de cadelinha. Hoje, até uma cambaxirra sabe que Pelé é imprescindível em qualquer escrete. Na Suécia, ele não tremerá de ninguém. Há de olhar os húngaros, os ingleses, os russos de alto a baixo. Não se inferiorizará diante de ninguém. E é dessa atitude viril e mesmo insolente que precisamos. Sim, amigos: — aposto minha cabeça como Pelé vai achar todos os nossos adversários uns pernas-de-pau.

terça-feira, 16 de junho de 2009

Elisabeth Bishop

UMA ARTE

A arte de perder não é nenhum mistério;
Tantas coisas contêm em si o acidente
de perdê-las, que perder não é nada sério.

Perca um pouquinho a cada dia.
Aceite, austero, a chave perdida, a hora gasta bestamente.
A arte de perder não é nenhum mistério.

Depois perca mais rápido, com mais critério:lugares, nomes, a escala subsequente
da viagem não feita..
Nada disso é sério.

Perdi o relógio de mamãe.
Ah! e nem quero lembrar a perda de três casas excelentes.
A arte de perder não é nenhum mistério.

Perdi duas cidades lindas.
E um império que era meu, dois rios, e mais um continente.
Tenho saudade deles. Mas não é nada sério.

-Mesmo perder você (a voz, o riso etéreo
que eu amo) não muda nada.
Pois é evidente
que a arte de perder não chega a ser mistério
por muito que pareça (Escreve!) muito sério
Colaboração da Tygel.

Só um lembrete do Quintana...

A vida é o dever que nós trouxemos para fazer em casa.
Quando se vê, já são seis horas!
Quando se vê, já é sexta-feira...Quando se vê, já terminou o ano...
Quando se vê, perdemos o amor da nossa vida.
Quando se vê já se passaram 50 anos!
Agora é tarde demais para ser reprovado.
Se me fosse dado, um dia, outra oportunidade, eu nem olhava o relógio.
Seguiria sempre em frente e iria jogando, pelo caminho, a casca dourada e inútil das horas.
Desta forma, eu digo: Não deixe de fazer algo que gosta, devido à falta de tempo,pois a única falta que terá, será desse tempo que infelizmente não voltará mais.
Mário Quintana (texto enviado pela "colaboradora LÊ")


sexta-feira, 5 de junho de 2009

O amor acaba (Paulo Mendes Campos)

O amor acaba. Numa esquina, por exemplo, num domingo de lua nova, depois de teatro e silêncio; acaba em cafés engordurados, diferentes dos parques de ouro onde começou a pulsar; de repente, ao meio do cigarro que ele atira de raiva contra um automóvel ou que ela esmaga no cinzeiro repleto, polvilhando de cinzas o escarlate das unhas; na acidez da aurora tropical, depois duma noite votada à alegria póstuma, que não veio; e acaba o amor no desenlace das mãos no cinema, como tentáculos saciados, e elas se movimentam no escuro como dois polvos de solidão; como se as mãos soubessem antes que o amor tinha acabado; na insônia dos braços luminosos do relógio; e acaba o amor nas sorveterias diante do colorido iceberg, entre frisos de alumínio e espelhos monótonos; e no olhar do cavaleiro errante que passou pela pensão; às vezes acaba o amor nos braços torturados de Jesus, filho crucificado de todas as mulheres; mecanicamente, no elevador, como se lhe faltasse energia; no andar diferente da irmã dentro de casa o amor pode acabar; na epifania da pretensão ridícula dos bigodes; nas ligas, nas cintas, nos brincos e nas silabadas femininas; quando a alma se habitua às províncias empoeiradas da Ásia, onde o amor pode ser outra coisa, o amor pode acabar; na compulsão da simplicidade simplesmente; no sábado, depois de três goles mornos de gim à beira da piscina; no filho tantas vezes semeado, às vezes vingado por alguns dias, mas que não floresceu, abrindo parágrafos de ódio inexplicável entre o pólen e o gineceu de duas flores; em apartamentos refrigerados, atapetados, aturdidos de delicadezas, onde há mais encanto que desejo; e o amor acaba na poeira que vertem os crepúsculos, caindo imperceptível no beijo de ir e vir; em salas esmaltadas com sangue, suor e desespero; nos roteiros do tédio para o tédio, na barca, no trem, no ônibus, ida e volta de nada para nada; em cavernas de sala e quarto conjugados o amor se eriça e acaba; no inferno o amor não começa; na usura o amor se dissolve; em Brasília o amor pode virar pó; no Rio, frivolidade; em Belo Horizonte, remorso; em São Paulo, dinheiro; uma carta que chegou depois, o amor acaba; uma carta que chegou antes, e o amor acaba; na descontrolada fantasia da libido; às vezes acaba na mesma música que começou, com o mesmo drinque, diante dos mesmos cisnes; e muitas vezes acaba em ouro e diamante, dispersado entre astros; e acaba nas encruzilhadas de Paris, Londres, Nova Iorque; no coração que se dilata e quebra, e o médico sentencia imprestável para o amor; e acaba no longo périplo, tocando em todos os portos, até se desfazer em mares gelados; e acaba depois que se viu a bruma que veste o mundo; na janela que se abre, na janela que se fecha; às vezes não acaba e é simplesmente esquecido como um espelho de bolsa, que continua reverberando sem razão até que alguém, humilde, o carregue consigo; às vezes o amor acaba como se fora melhor nunca ter existido; mas pode acabar com doçura e esperança; uma palavra, muda ou articulada, e acaba o amor; na verdade; o álcool; de manhã, de tarde, de noite; na floração excessiva da primavera; no abuso do verão; na dissonância do outono; no conforto do inverno; em todos os lugares o amor acaba; a qualquer hora o amor acaba; por qualquer motivo o amor acaba; para recomeçar em todos os lugares e a qualquer minuto o amor acaba.

segunda-feira, 1 de junho de 2009

Epígrafes da Oficina

01/04 – “O escritor que se recolhe e, antes de mais nada, empreende uma viagem para dentro de si mesmo haverá de encontrar a regra eterna da literatura: é preciso ter o talento de contar as próprias histórias como se fossem histórias dos outros, e contar as histórias dos outros como se fossem suas, porque é isso a literatura. Mas antes é preciso viajar pelas histórias e pelos livros dos outros.”Orham Pamuk, O Livro Negro

08/04 – “A verdade verdadeira é sempre inverossímil. Para tornar a verdade mais verossímil, precisamos necessariamente adicionar-lhe a mentira.” Stiepanóvitch, em Os Demônios, de Dostoievski.

15/04 – “Tudo é autobiográfico. Não há história que não seja confessional.” Amóz Oz, De Amor e Trevas
“Somos o que lembramos e, basicamente, o que não lembramos, ou não queremos lembrar.” Rogério Menezes (provavelmente)

22/04 – “A grande literatura não se dirige à nossa capacidade de julgamento, e sim à nossa capacidade de nos colocarmos no lugar do outro.”Orham Pamuk

29/04 – “Existe uma previdência especial até na queda de um pássaro.” Hamlet, em Hamlet, de Shakespeare “A fofoca é a prima pobre da grande literatura.”Amóz Oz

06/05 – “A vida é uma história contada por um idiota, cheia de som e fúria, e não significando nada." Macbeth, de Shakespeare

13/05 – “Meu pai dizia: se você rouba seu saber de um livro só, vai ser muito criticado, chamado de plagiador, ladrão literário. Mas se rouba de dez livros, já é considerado pesquisador e se de trinta, quarenta livros – um grande pesquisador.” Amóz Oz

20/05 – “O ponto de partida da verdadeira literatura é o homem que fecha a porta e se recolhe com seus livros.” Orham Pamuk, discurso prêmio Nobel

27/05 – “Nada pode ser mais espantoso que a vida, exceto a literatura.” Orham Pamuk, O Livro Negro
- “Quanto maior a sabedoria, maior o sofrimento; e quanto maior o conhecimento, maior o desgosto.” Eclesiastes

sábado, 30 de maio de 2009

Orishas- conjunto de "rap" cubano da lista da Bel

Os 10 mais da Bel



LIVROS
A marca de uma lágrima,
Pedro Bandeira
Como água para chocolate,
Laura Esquivel
A sombra do vento,
Carlos Ruiz Zafón
Por parte de pai,
Bartolomeu Campos Queiroz
Ensaio sobre a cegueira,
José Saramago
A audácia dessa mulher,
Ana Maria Machado
Jim Knopf (dois livros),
Michael Ende
Harry Potter (coleção),
J.K. Rowling
Através do Espelho,
Jostein Gaarder
Ela e outras mulheres,
Rubem Fonseca

FILMES Moulin Rouge,
de
Wallּ e,
de Andrew Stanton
O Labirinto do Fauno,
de Guillermo Del Toro
A Vila,
de M. Night Shyamalan
Bubble,
de Eytan Fox
Pro dia nascer feliz,
de João Jardim
Capote,
de Bennett Miller
À Espera de um Milagre,
de Frank Darabont
O Iluminado,
de Stanley Kubrick

ESCRITORES

- Pedro Bandeira
- Luis Fernando Veríssimo
- Rubem Fonseca
- Dennis Lehane
- Fernando Pessoa
- Vinicius de Morais
- Edgar Alan Poe
- Luiz Alfredo García-Roza

MUSICISTAS-INTÉPRETES/BANDAS

- Bia Bedran (infantil brasileiro)
- Orishas (RAP CUBANO)
- The Beatles (rock britânico)
- Caetano Veloso (MPB)
- Chico Buarque (MPB)
- Cazuza (rock brasileiro)
AO REDOR DO MUNDO
- Torre Eifel (Paris, França)
- Muro das Lamentações (Jerusalém, Israel)

CITAÇÕES
- “O mistério das coisas? Sei lá o que é mistério! O único mistério é haver quem penso no mistério”, Fernando Pessoa
- “Porque o único sentido oculto das coisas é elas não terem sentido oculto nenhum”, F. Pessoa
- “Leitura era coisa séria e escrever mais ainda. Escrever era não apagar nunca mais” – Bartolomeu Campos Queiroz, Por parte de pai
- “As palavras têm muitos gostos e era impossível saber seus sabores verdadeiros” – Bartolomeu C. Queiroz, Por parte de pai
- “Hoje o verbo pássaro me ensinou a voar” – Lucas Dain
- “Gente que não curte ler. Esquisito mesmo. Sei lá, nesses casos, sempre acho que é como se a pessoa estivesse dizendo que não curte namorar” – Ana Maria Machado, prefácio de Comédias para se ler na escola, Luis Fernando Veríssimo

terça-feira, 26 de maio de 2009

Hoje tem

Hoje 26/05/2009 tem Anne-Sophie Mutter em Düsseldorf. Para nós pobres mortais tem aqui no Imponderável!

segunda-feira, 25 de maio de 2009

Eu adoro esta!!!


Milho Cozido
Carlos Drummond de Andrade

A primeira vez que eu vi alguém na rua comer milho cozido, confesso que me espantei.A segunda, não estranhei tanto. A terceira, tive tentação de pedir-lhe:
– Desculpe, moça. Posso provar um tiquinho?
Porque era moça, por sinal bem-apanhada. Não pedi, infelizmente. Ou felizmente, porque
ela não só me recusaria o pedido como poderia mesmo estranhá-lo, achando-me atrevidão.
Refleti logo como havia entre nós a distância infinita de algumas gerações, pois ela fazia o
que eu gostaria de fazer e não tinha coragem, nem mesmo nunca pensara nisso: saborear na
rua uma tentadora espiga de milho verde.
E daí, quem sabe se toparia? Garota moderna, desinibida, comendo quando lhe apetecia,
natural que compreendesse o desejo de alguém, despertado da visão do milho bom de
comer. Se não topasse, a distância entre nós não seria tão grande assim: apenas moça
preconceituosa, incapaz de compreender que minha intenção era simplesmente provar do
milho, e não arranjar pretexto para aproximação, com fins obscuros e suspeitos.
Embaraçado, limitei-me a olhá-la com o rabo do olho, pois íamos no mesmo frescão, ela ao
meu lado, e era impossível não tomar conhecimento daquele pausado e delicado comer um
milho que vinha de antiqüíssimas fazendas da minha lembrança... um milho tão recuado,
tão perdido em brumas do século, sem mais nem menos viajando comigo naquele ônibus,
trincado pelos dentes da moça, que o comia com muita desenvoltura e ao mesmo tempo
com muita classe.
Ela, é claro, nem se dignava a tomar conhecimento de mim, com essa faculdade admirável
que têm as mulheres de estarem ausentes na mais indubitável presença. E dava uma
mordidinha e parava e recomeçava, atenta ao ritmo e às boas maneiras. Nada mais natural,
mais civilizado, sem provocação aos últimos defensores de que comer num coletivo é falta
grosseira de “berço”.
A espiga consumia-se. Eu sempre com vontade de provar, e mudo e quedo na minha
inibição. Não tinha olhos de cão pedinte, não ousaria tanto, mas comecei a duvidar da
inteligência e do coração da moça. Então ela não via que ao seu lado estava um senhor
carente e desejante de comer daquele milho, e que lhe custaria renunciar a uns poucos
grãos, para satisfazer tão humilde carência? Eu era um desconhecido, sim, mas o
desconhecido deixa de sê-lo a um rápido olhar de benevolência e duas ou três palavras
reveladoras.
Só em Botafogo me ocorreu que podia repugnar-lhe a idéia de a espiga passar por duas
bocas. Em Copacabana, perto de dois terços de espiga tinham-se desnudado; no Leblon
terminaria a refeição, pelo esgotamento da peça. Não pude deixar de admirar a competência
da moça, que nem se atrasava nem se afobava. Parecia até que cronometrara o ato de comer
pela duração da viagem de ônibus. Se morasse em São Conrado, destruiria duas espigas? O
fato é que degustava calma e delicadamente o glúten, o amido, as proteínas, ou, para falar
verdade,o sabor da mistura, sem identificação de elementos. O milho deixava-se papar,
talvez agradecendo a delicadeza com que era papado. Escapara do carrinho do vendedor
ambulante para cair nos dentes de uma bela moça egoísta que nem sequer se lembrava de
que pertinho dela um senhor de origens rurais passara a ter subitamente imperiosa
necessidade de comer milho verde, milho assado, milho cozido, qualquer variedade ou
modalidade de milho, e elas são milhares.
Ah, por que não fiz o que era tão fácil de fazer, passar na carrocinha e comprar a minha
espiga, mostrar à moça que também eu apreciava essa comidinha despretensiosa e amável?
Mas como, se eu não tinha, minutos antes, a menor tentação de comer milho, e só a sentira
ao ver a moça? Seria autêntica essa tentação, ou eu me comportava como reles imitador de
gestos alheios, sem correspondência com a massa dos meus gestos habituais, normalmente
programados? Na dúvida, arrisquei-me a olhá-la sem cerimônia, direto, quase provocador.
Não deu sinal de perceber minha indiscrição. Comendo estava, comendo continuou, na
mesma toada. E o milho acabando. E eu sentindo que a essa altura já não adiantava pedir
nada à moça. Na melhor hipótese me estenderia o sabugo despojado, com um ou dois grãos
de sobejo, irônicos. E já ia passando a minha vontade de comer aquele milho daquela
espiga, Deus (ou o Diabo) sabe lá por quê. Em vão procurara me iludir pensando num
milho anônimo, genérico, universal. Se a moça retirasse da bolsa outra espiga e a
oferecesse à minha gula, não me apeteceria. Aquela é que despertara em mim o desejo
manducativo, ligado a fortes e escondidas subjacências temporais. A moça desceu antes
de mim, depois de embrulhar cuidadosamente o sabugo em papel fino e guardá-lo na bolsa.
Continuei, já agora de estômago saciado. Eu comera toda a espiga de milho.

sexta-feira, 22 de maio de 2009

NO TE RINDAS
No te rindas, aún estás a tiempo
De alcanzar y comenzar de nuevo,
Aceptar tus sombras,
Enterrar tus miedos,
Liberar el lastre,
Retomar el vuelo.
No te rindas que la vida es eso,
Continuar el viaje,
Perseguir tus sueños,
Destrabar el tiempo,
Correr los escombros,
Y destapar el cielo.
No te rindas, por favor no cedas,
Aunque el frío queme,
Aunque el miedo muerda,
Aunque el sol se esconda,
Y se calle el viento,
Aún hay fuego en tu alma
Aún hay vida en tus sueños.
Porque la vida es tuya y tuyo también el deseo
Porque lo has querido y porque te quiero
Porque existe el vino y el amor, es cierto.
Porque no hay heridas que no cure el tiempo.
Abrir las puertas,
Quitar los cerrojos,
Abandonar las murallas que te protegieron,
Vivir la vida y aceptar el reto,
Recuperar la risa,
Ensayar un canto,
Bajar la guardia y extender las manos
Desplegar las alas
E intentar de nuevo,
Celebrar la vida y retomar los cielos.
No te rindas, por favor no cedas,
Aunque el frío queme,
Aunque el miedo muerda,
Aunque el sol se ponga y se calle el viento,
Aún hay fuego en tu alma,Aún hay vida en tus sueños
Porque cada día es un comienzo nuevo,
Porque esta es la hora y el mejor momento.
Porque no estás solo, porque yo te quiero.

Mario Benedetti (1920-2009)

quarta-feira, 20 de maio de 2009

Lista da Márcia


Viagens:
· Paris (de surpresa)
· Grand Cannyon
· Cunha (SP) para ver os trabalhos dos ceramistas que residem lá
· Salvador na Casa da minha avó
· Cidades históricas de minas, qdo fui com meus pais e depois qdo voltei com minhas filhas.
Obras de Arte:
· As meninas (Velásquez)
· “Le radeau de la meduse” (Gericault)
· Modigliani
· Soutine
· Exposição de cerâmica do Picasso, na Casa França Brasil
· Exposição dos Retratos de Paris
Filmes:
· Retratos da Vida
· As Pontes de Madison
· Como água para chocolate
· Vida de inseto
· Documentário Sobre o Nelson Freire (João Moreira Sallles)
· Betty Blue 37,5
· Dersu Uzala
Livros:
· As Meninas Exemplares (Condessa de Ségur)
· Minha Vida de Menina (Helena Morley)
· O Apanhador no Campo de Centeio (J.D.Salinger)
· Cartas a Theo
· Larrousse Gastronomique
· A menina sem estrela (Nelson Rodrigues)
· O Óbvio Ululante (Nelson Rodrigues)
· O Mundo Que eu vi (Stefan Zweig)
· Guerra e Paz (Tolstói)
· Meu Pé de Laranja Lima (José Mauro de Vasconcelos)
· O tempo e o Vento (Érico Veríssimo)

Músicas:
· Bohemian Rapsody (Queen)
· Fire and Rain (James Taylor)
· Bachianas Brasileiras (Villa-Lobos)
· Scherazade (Rimsky Korsakov)
· Eu te Amo (Chico Buarque)
· Visto assim do alto ...
· Meu caminho é cada manhã (Kiko Zambianchi)
· It´s Rainning Men, Alelulia...
· Devolva-me (Com a Adriana Cantando)
· Debaixo dos caracóis dos Seus Cabelos (R.C)
· Águas de Março
· O Bêbado e o equilibrista
· Para não dizer que não falei de flores (G. Vandré)

sexta-feira, 15 de maio de 2009

Lista da Tygel



Exposições que me emocionaram:
Arqueológica da China – vi o homem da China, com seus artefatos (de mais de 30.000 anos atrás) , ou melhor, pedaço do crânio dele, em San Francisco;
Mona Lisa, no Louvre;
Van Gogh – no Museu d'Orsay;
Goya e Velasquez– no Prado;
Viagens inesquecíveis:
Serra João do Vale, no sertão do RN, onde conheci uma comunidade que seguira um líder messiânico e ficara lá isolada do mundo até aquela data;
Grutas de Altamira, no norte da Espanha, no caminho para Santiago de Compostela;
Os jardins suspensos e a igreja da Sagrada Família, de Gaudí, em Barcelona;
A casa de Anne Frank, em Amsterdã;
Crato, no Ceará, onde surpreendi um encontro de repentistas;
Filmes que me impressionaram:
Macunaíma;
Deus e o diabo na terra do sol;
Doze homens e uma sentença (Twelve angry men);
Casablanca;
O declínio do império americano;
Invasões bárbaras;
Les parapluies de Cherbourg;
2001, uma odisséia no espaço;
Vertigem , do Hitchcock;
Central do Brasil;
Muito além do jardim;
Pulp fiction;
Traídos pelo desejo;
A hora da estrela;
Livros que tiveram papel importante para mim:
Triste fim de Policarpo Quaresma, de Lima Barreto;
Dom Casmurro, de Machado de Assis;
Grande sertão, veredas, de Guimarães Rosa;
Obra poética, de Fernando Pessoa;
Madame Bovary, de Flaubert;
L'Etranger, de Camus;
O Capital, de Marx;
Obra poética, de Carlos Drummond de Andrade;
Galvez, o imperador do Acre, de Marcio de Souza;
Quarup, de Antonio Callado;

Crônica do Fernando Sabino

O gato sou eu
(fernando Sabino)
- Aí então, eu sonhei que tinha acordado. Mas continuei dormindo.
- Continuou dormindo.
- Continuei dormindo e sonhando. Sonhei que estava acordado na cama, e ao lado, sentado na cadeira, tinha um gato me olhando.
- Que espécie de gato?
- Não sei. Um gato. Não entendo de gatos. Acho que era um gato preto. Só sei que me olhava com aqueles olhos parados de gato.
- A que você associa essa imagem?
- Não era uma imagem: era um gato.
- Estou dizendo a imagem do seu sonho: essa criação onírica simboliza uma profunda vivência interior. É uma projeção do seu subconsciente. A que você associa ela?
- Associo a um gato.
- Eu sei: aparentemente se trata de um gato. Mas na realidade o gato, no caso, é a representação de alguém. Alguém que lhe inspira um temor reverencial. Alguém que a seu ver está buscando desvendar o seu mais íntimo segredo. Quem pode ser essa alguém, me diga? Você deitado aí nesse divã como na cama em seu sonho, eu aqui nesta poltrona, o gato na cadeira… Evidentemente esse gato sou eu.
- Essa não, doutor. A ser alguém, neste caso o gato sou eu.
- Você está enganado. E o mais curioso é que, ao mesmo tempo, está certo, certíssimo, no sentido em que tudo o que se sonha não passa de uma projeção do eu.
- Uma projeção do senhor?
- Não: uma projeção do eu. O eu, no caso, é você.
- Eu sou o senhor? Qual é, doutor? Está querendo me confundir a cabeça ainda mais? Eu sou eu, o senhor é o senhor, e estamos conversados.
- Eu sei: eu sou eu, você é você. Nem eu iria pôr em dúvida uma coisa dessas, mais do que evidente. Não é isso que eu estou dizendo. Quando falo no eu, não estou falando em mim, por favor, entenda.
- Em quem o senhor está falando?
- Estou falando na individualidade do ser, que se projeta em símbolos oníricos. Dos quais o gato do seu sonho é um perfeito exemplo. E o papel que você atribui ao gato, de fiscalizá-lo o tempo todo, sem tirar os olhos de você, é o mesmo que atribui a mim. Por isso é que eu digo que o gato sou eu.
- Absolutamente. O senhor vai me desculpar, doutor, mas o gato sou eu, e disto não abro mão.
- Vamos analisar essa sua resistência em admitir que eu seja o gato.
- Então vamos começar pela sua insistência em querer ser o gato. Afinal de contas, de quem é o sonho: meu ou seu?
- Seu. Quanto a isto, não há a menor dúvida.
- Pois então? Sendo assim, não há também a menor dúvida de que o gato sou eu, não é mesmo?
- Aí é que você se engana. O gato é você, na sua opinião. E sua opinião é suspeita, porque formulada pelo consciente. Ao passo que, no subconsciente, o gato é uma representação do que significo para você. Portanto, insisto em dizer: o gato sou eu.
- E eu insisto em dizer: não é.
- Sou.
- Não é. O senhor por favor saia do meu gato, que senão eu não volto mais aqui.
- Observe como inconscientemente você está rejeitando minha interferência na sua vida através de uma chantagem…
- Que é que há, doutor? Está me chamando de chantagista?
- É um modo de dizer. Não vai nisso nenhuma ofensa. Quero me referir à sua recusa de que eu participe de sua vida, mesmo num sonho, na forma de um gato.
- Pois se o gato sou eu! Daqui a pouco o senhor vai querer cobrar consulta até dentro do meu sonho.
- Olhe aí, não estou dizendo? Olhe a sua reação: isso é a sua maneira de me agredir. Não posso cobrar consulta dentro do seu sonho enquanto eu assumir nele a forma de um gato.
- Já disse que o gato sou eu!
- Sou eu!
- Ponha-se para fora do meu gato!
- Ponha-se para fora daqui!
- Sou eu!
- Eu!
- Eu! Eu!
- Eu! Eu! Eu!

quinta-feira, 14 de maio de 2009

Muito Prazer

Na aula de ontem, nossa amiga Angela Nabuco, fez a gentileza de trazer um livro de um escultor indiano que ela gosta muito. Quem não teve a oportunidade de ver o livro, aqui vai uma sugestão é só clicar Anish Kapoor

segunda-feira, 11 de maio de 2009

O aniversariante


O pintor Salvador Dali faria 105 anos hoje, 11 de maio.

O professor o citou em sala de aula, no nosso" índice remissivo". Falou também sobre um quadro de uma mulher na janela, que eu acho que era o que está reproduzido acima. Quando ele falou sobre o quadro pensei que era um desenho em sépia de Gala na Janela, mas acho que me enganei.
Deixo o endereço de um video no youtube. O aniversariante aparece num programa tipo "Silvio Santos". http://www.youtube.com/watch?v=iXT2E9Ccc8A
OBS: Não consegui colocar o video aqui nesta postagem, mas para assistir, é só colocar o endereço acima que o link vai direto ao vídeo no Youtube. Márcia

sexta-feira, 8 de maio de 2009


O "imponderável" e as Torres Gêmeas

Em boca fechada não entra mosca. Acho que este tem sido o provérbio que mais ouço nesta vida e nem por isso "dou ouvidos" .
Não é raro me arrepender de falar demais! Não acredito em horóscopo, o que não me impede de dar uma espiadela, quase que diariamente, no que os astros reservam para mim. E, quase sempre os astros aconselham-me a ser mais reservada, a ouvir mais e falar menos.
Minha família acostumada aos meus palpites, não faz nada sem perguntar primeiro o que eu acho, e se por acaso ninguém perguntar, não tem problema eu dou minha opinião e como se diz: “meto o bedelho onde não sou chamada”.
Foi em junho de 2001.
O marido perguntou o que eu achava de viajarmos para os Estados Unidos com as duas crianças.
Iríamos primeiro à Disney e depois seguiríamos para Nova Yorque onde mora minha irmã.
Eu poderia ter dito apenas sim, ou qualquer coisa como oooobba! Vamos sim.
Mas não, não posso me furtar a falar além da conta. Disse ao marido que se, naquele momento tínhamos o dinheiro, o tempo e a saúde aquele era o momento certo, já que não sabemos o dia de amanhã.
Assim fizemos. Passeamos bastante com as crianças pela Disney.
Se eu, falo demais, o marido se diverte um pouco demais para o meu gosto. Depois da cansativa Disney voamos para Nova Yorque.
Eu não conhecia a "Big Apple" e o marido resolveu fazer as honras da casa, mostrando tudo o que podia, no menor espaço de tempo.
Organizado, geralmente ele leva um roteiro que mais parece uma tese de mestrado. Não fica satisfeito enquanto não "tica" todos os pontos turísticos assinalados.
Saíamos de casa muito cedo e chegávamos bem tarde, com as crianças exaustas. Eu ainda tinha que dar banho e comida para as duas meninas, enquanto ele fazia as contas e o roteiro do dia seguinte.
Perdão, sei que este texto está ficando cansativo, como a viagem, eu avisei que falo demais. Se o leitor quiser dar uma paradinha, tomar um cafezinho e se ainda assim quiser voltar, eu espero.
Fazia um dia lindo de primavera em NovaYorque, no céu azul só havia aqueles risquinhos brancos dos rastros deixados pelos aviões.
Um excelente dia para um passeio de ferry, para mostrarmos as crianças a Estátua da Liberdade. Depois ainda, andamos pela Broadway, pegamos metrô, ônibus, subimos o Empire Estate e finalmente, fomos descansar ao pé do World Trade Center.
Havia um violinista tocando uma linda música e eu achei que era uma ótima maneira de terminarmos aquele dia tão movimentado.
O marido ainda não estava satisfeito e quis saber o que eu achava dele subir as torres gêmeas para ver o entardecer...
Ele já tinha ido a NovaYorque, alguma vezes e nunca subiu às torres, o dia estava lindo e além do mais tinha comprado um daqueles passes de turista que dava direito a visita. Eu não quis demonstrar que estava exausta, doida para pegar o trem de volta, e ao invés de, falar um não redondo, ponderei:
- Querido, até que seria uma boa, mas vejo que as crianças estão exaustas. Além do mais, esta não é a ultima vez que você vem a Nova Yorque, deixe para a próxima. Estas torres estão aí há duzentos mil anos (exagerei) quando você vier, de uma próxima vez, você sobe.

A festa na casa do compadre

Pessoal, coisa ótima, esse blog! Aí vai a minha primeira contruibuição, acreditem ou não, fato verídico no interior mineiro:

A manhã já ia alta, na estrada de terra.
Marinho arreou o cavalo e botou roupa arrumada.
Saiu de galope, chicotada no lombo do bicho, que zuniu estrada afora, rumo à cidade.
Passou por um carro apressado, que levantava pó.
Depois que a poeira baixou, pôde enxergar claro, o céu azul dos tempos de seca, o capim amarelado de sol, tudo esturricado, e o silêncio ocupando tudo.
De vez em quando ouvia o pio da siriema, como um lamento, melodiando longe, no pasto.
O cavalo agora pisava macio, passo compassado, marchador: - Vale um troco, esse danado!
Marinho ia abrindo e fechando as porteiras, isso era de lei.
Quando passava por outro cavaleiro, levantava o chapéu, e o cumprimento vinha respeitoso: - Sim sinhô! E a resposta: - Sim sinhô, sim!
De um casebre na beira da estrada saíram dois cachorros, latindo e correndo atrás do cavalo, mostrando serviço ao dono: - Cachorrada sarnenta, que mania besta, sô!
Meio caminho andado, Marinho apertou os olhos para enxergar longe: parecia um punhado de gente no terreiro em frente à casa do compadre.
O cavalo foi chegando perto e confirmando a pequena multidão. Era tanta gente que não cabia na casa, e quem sobrava se espalhava pelo terreiro, debaixo do sol, que nenhuma nuvem atenuava. Crianças corriam entre os carros estacionados no pátio.
- Um festão! Pensou. - E eu de fora!
Homem enorme que era, Marinho foi chegando e se fazendo anunciar pelo vozeirão. De forma a ser ouvido de dentro da casa, berrou de cima do cavalo, antes mesmo de apear:
- Êta farra boa, o povo está com os olhos inchados de tanto beber! Está com raiva de mim, compadre? Não vem me receber?
Foi então informado por uma voz que veio, baixinha, do meio do povo: - É enterro, seu moço, o compadre morreu, e os olhos estão inchados, mas é de tanto chorar!
Pego de surpresa, a resposta saiu num susto, automática, de rompante: - Pois então, meus parabéns!
Inclinou o braço para o lado, levando a rédea, e atrás dela o cavalo.
Sumiu depressa na curva fechada, onde ninguém mais o poderia ver.
A não ser o sol, que já estava quase a pino na estrada de terra.

Angela Nabuco
. Bom dia. Estou postando para avisá-los que fiz uma tremenda confusão. Tenho dois bloggers. O pessoal, "http://deixaqueimar.blogspot.com/" e o com meus textos "http://ocarbonizado.blogspot.com/", só que só consigo me logar a este blogger com um outro blogger que errei o e-mail e deletei. Enfim, já que estou postando, vou crial coragem e pôr um texto meu aqui.

Nuances da morte

Paulie: ânsia, que ânsia sufocante que se apodera de mim! Sentir-te, até perder-me em mim; cheirar-te, até que nenhuma outra fragrância se oponha à sua; comer-te, até confundir nossas entranhas; beijar-te, até que roubes o rubor da minha face ensandecida...
Marie: e, depois que o mundo já não for mundo e minha alma já não for minha, estarei perdida entre brancas nuvens serenas ou o queimar lancinante que nos faz renascer – punição eterna – ou, quem sabe, espectador da própria tragédia. Que dirá então, meio termo? Celas cinza, lisas, enfadonhas, apáticas; onde fica-se surdo dos pensamentos e cego dos sentidos...Quem há de suportar...?
Sophie: ergo-me; caio; ergo-me novamente – presa estou – enclausurada, acorrentada; ferida. Andei pelos três estágios da Morte, passei por cobras com olhos de rubi e águias de ouro. Fiz o que foi-me ordenado e continuo sem a resposta – valerá a pena?
Paulie: o que me prende aqui? Que vínculos ainda há? E, por quem meu coração ainda clama? Desejo, anseio, grito até perder a voz; nada de decidir-me. O erro, cruel possibilidade, amarra-me, mais e mais. Ai de mim!
Marie: como pode dor tão cruel apoderar-se de mim? Deitar-me-ei.
Sophie: viajei e vi diversos caminhos, interligados e infinitos... Conheci a dor, conversei com a solidão, beijei a angústia; pelo outro lado, abracei o alívio e despedi-me da culpa. Voei por altas montanhas e, vendo a vida por cima, blasfemei Deus. Mergulhei em um rio transparente que, sem nada pedir em troca, curou-me os flagelos; a bondade não se extinguiu por completo. No balanço final, quando o vento perguntou-me se nada havia a perder, emudeci; perdi a voz.
Marie: levante-se, levante-se, ainda há esperanças!
Paulie: deixe-me, vá embora! Perdi-me nas minhas nuances, apaguei-me no meu próprio sangue e, no bombear do meu coração, insensível sou a qualquer minúscula gota de vida. Apunhalar-me-ia, caso houvesse certezas...
Sophie: perdi, por fim, a imaginação e o vazio e a apatia apoderam-se de mim. Nada mais vejo nos meus delírios e, com o último gole, entregar-me-ei ao mistério!
Marie: sim, apenas um gole! Veneno este tão doce que, finalmente, trará a paz.
Paulie: Liberto-me! Voarei pelo infinito; livre! Destruindo a mim, destruirei também os incontáveis demônios que me fazem definhar e, por mim, estarei só!

. Uffa, postei, rs.

quinta-feira, 7 de maio de 2009

Aqui vamos nós!

Este é o marco zero de um blog que, espero, deverá ter vida longa. Registrará os (des)pensamentos e (des)reflexões das dez pessoas que participam da Oficina da Crônica, ocorrida na Estação das Letras, Rio de Janeiro, entre 1 de abril e 24 de janeiro.
Caros oficineiros, usem e abusem desse espaço, publiquem suas (des)crônicas e quaisquer outras ocorrências, imponderáveis ou, não que lhes ocorrerem.
Sem o imponderável, o ato de escrever nunca acompanhará o movimento dos barcos (referência à clássica canção de Caetano Veloso; os que não conhecem podem recorrer ao tio Google).
Bem-vindos a bordo e, acreditem, tê-los como companheiros de bordo nessa nau sem rumo é um privilégio para mim.
Abraço grande,
Rogerio Menezes/Antonio Martiniano

quinta-feira, 30 de abril de 2009